A Garganta da Serpente
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Ser Paulista

I

Ser paulista é...
suspirar aliviado depois de uma viagem
de ônibus, trem ou metrô,
enfiado num aglomerado
de gente apertada,
de feições angustiadas,
às vezes sonolentas,
olhares vazios, pensamentos a mil.

Ser paulista é...
achar que se está só no meio da multidão,
trabalhar muito a qualquer hora,
do dia ou da noite,
achar que se ganha um dinheirão,
mas no final do mês,
descobrir que se gastou um montão.

Ser paulista é...
pedir ao garçom um chopps e dois pastel,
chamar alguém por "meu"
sem mesmo conhecê-lo,
fazer tudo correndo e ainda
achar que nunca há tempo pra nada.

Ser paulista é...
passar feriadão na praia,
voltar com cor de camarão,
trazer na bagagem caranguejo, banana,
saco de batata e laranja
e muita, muita paciência pra enfrentar
fileiras de carros, carrões, caminhões e,
no caminho ainda dar uma paradinha
pra comer pamonha,
cachorro quente,
Big Mac.

Ser paulista é...
fazer passeios
no Ibirapuera,
no Museu do Ipiranga,
no Zoológico,
tudo... tudo apinhado de gente,
carros, bicicletas, patins,
skates e cachorros.

Ser paulista é...
passar fim de semana sentindo frio,
vendo chuva cair pela janela do apê,
ir ao shopping
e não conseguir parar o carro,
voltar pra casa, estourar pipoca,
assistir Faustão,
ir pra cama pensando no dia seguinte
na cara do patrão
e no belo Sol que, apesar da poluição,
certamente surgirá.


II

Ser paulista é...
falar ao telefone, tomar nota,
ler no computador,
atender cliente, chefe, empregada, babá,
tudo ao mesmo tempo,
sem perder o bom humor
e a esperança de que um dia tudo irá melhorar.

Ser paulista é...
comer pizza, churrasco de rodízio,
andar de metrô,
caminhar na Paulista - a avenida,
tomar sopa de cebola de madrugada
e café em qualquer bar de esquina.

Ser paulista é...
não se dar conta de que
apenas morando na capital
possa não ser, de fato, um paulista,
mas sim um mineiro,
ou um baiano, um cearense,
um pernambucano,
quando muito...
um paulistano.

Ser paulista é... andar apressado,
bem vestido com roupa de grife,
de batom na cor da moda,
cabelos arrumados no SoHo,
usar perfume importado, celular no bolso,
bolsa a tiracolo, sorrir dissimulado,
ficar de coração acelerado
parado no farol,
bater papo rápido no ponto de ônibus,
chegar atrasado no trabalho,
tomar lanche em pé no "Dá Licença",
e nunca faltar no happy hour
às sextas, com direito a videokê
para espantar todos os males da semana.

Ser paulista é...
torcer para o Corinthians ou Palmeiras,
ir às domingueiras ou rodas de pagode,
fazer compras na José Paulino
ou 25 de Março,
morar na Zona Leste
ou numa quitinete no centro,
cantarolar Trem das Onze
ou Hino da Fiel.

Ser paulista é...
antes de tudo ser brasileiro,
levar a vida com esperanças,
de olho no futuro,
sem esquecer lições do passado,
receber de braços abertos todo migrante,
sorrir com simplicidade,
demonstrar alegria e sensualidade,
com um aperto de mãos selar a amizade
e dizer... obrigado!



João Brito

(É paulista da pequena cidade de Birigüi, 44 anos, 4 filhos, iniciou sua carreira literária em 1996. Reside atualmente em São Paulo e trabalha na área de Recursos Humanos.)
postado em 03/12/03
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